Medo
Falávamos
sobre como a autogestão chama a autonomia, como elas caminham
juntas. Queremos acrescentar que elas mantêm afastado um grande
perigo que não é exterior a nós, mas, ao contrário, é interior a
nós: o nome dele é medo... Por medo, muitos fazem as piores
coisas do mundo, as mais nocivas, as mais vergonhosas. Medo da
diminuição do “padrão de vida”: alguém pode dizer que é
normal fazer peças publicitárias que estimulam as pessoas a
ingerirem alimentos e bebidas realmente nocivos, com a justificativa
de que necessita “garantir o seu pão”, pois ele é como todo
mundo, tem contas para pagar, precisa sobreviver. Quanto maior é o
seu “padrão de vida”, maior é o seu medo de “ficar mais
pobre”. Portanto, cada vez mais, ele depende da conservação
de uma lógica de mercado perversa. Medo da mudança: a esposa
olha para o seu marido e se dá conta de que a relação conjugal
está naufragando há tempos; apesar disso, ela ainda se agarra ao
casamento por medo de sentir-se abandonada: “Se está ruim assim,
estará pior se tudo acabar!”, é o seu raciocínio... Medo de
perder o emprego numa instituição de ensino, bancária, pública
ou outra qualquer. Medo de não ter acesso fácil aos anestésicos;
medo do julgamento moral dos outros; medo da ruptura com certos
hábitos que dão uma aparente sensação de segurança e
tranquilidade; medo do seu futuro... Medo, medo, medo... Em suma,
não nos parece ser suficiente a justificativa de que se alguém faz
as piores coisas é porque precisa sobreviver e sustentar os seus
filhos. Então, a existência segue, e as consequências nocivas das
ações que, muitas delas, são legitimadas pelo poder, continuam a embotar as
relações humanas. Se o trabalho do homem estivesse limitado a isso,
ou seja, a fazer aquilo em que não é colocado o seu coração,
não teríamos sentido algum em escrever estas palavras –
poderíamos fazer como muitos, lavar nossas mãos para, mais uma vez,
entregá-las à escrita de textos sensacionalistas, pois assim
continuaríamos a olhar para o próprio umbigo “bem sucedido”.
Mas nós não temos e não queremos um umbigo “bem sucedido”, não
damos importância a ele.
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